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terça-feira, abril 24, 2007

EM DEFESA DA MULHER ADÚLTERA: Estratégias de um advogado!

Depois de muita insistência do Jornalista Luciano Canhanga, teimoso e de OLHO sempre ATENTO, decidi partilhar convosco a minha reflexão a respeito da estratégia de um Advogado que vocês conhecem bem; e que veio em defesa da mulher adúltera. A história é famosa e sobejamente conhecida: Jo 8, 1-11.

Com efeito, a Lei de Moisés recomendava que toda a mulher apanhada a cometer adultério devia ser apedrejada. Ora, aquela mana apanhada em flagrante foi trazida diante de Jesus para o castigo preceituado pela Lei. «De acordo com a Lei de Moisés, esta mulher devia ser apedrejada», sentenciaram, os Fariseus e Escribas a espera que Jesus ratificasse a famosa prescrição!...Até aqui, tudo bem. Só que, depois, o Advogado da adúltera entrou em cena. Sigam o meu raciocínio e atentem à estratégia de Jesus Cristo:

1. Reparai que, com essa história, os Fariseus e os Escribas quiseram colocar Jesus entre a espada e a parede. Eis o grande dilema: Se Jesus dissesse que a mulher poderia ser apedrejada, como perceber a doutrina sobre o Amor ao Próximo que Jesus vinha pregando? Se pedisse que a mulher não fosse apedrejada, os Escribas e Fariseus acusariam Jesus de violar a Lei de Moisés. Foi nesta altura que o Advogado deu a famosa resposta que desconcertou e atrapalhou os juízes: «Quem nunca pecou -disse Jesus- que seja o primeiro a atirar a pedra!». Pois, é! E agora?...

2. Na verdade, o Único a atirar a pedra, seria o próprio Jesus Cristo já que, como sabemos, “nunca cometeu pecado algum”;

3. Quando Jesus disse que quem não tivesse pecado, fosse o primeiro a atirar a pedra, os juízes que montaram o tribunal, passaram a réus! É que depois de um rápido exame de consciência, os homens decidiram retirar-se um por um a começar pelo mais velho (se calhar, é o que mais pecados tinha!), deixando a pobre mulher com o seu Advogado!

4. Com o tribunal em debandada (porque os juízes passaram a réus em fuga), o Advogado Jesus teve Ele mesmo de pronunciar a sentença, depois de um diálogo com a sua “cliente” de ocasião!

5. No novo diálogo com a mulher, Jesus não aprova o pecado por ela cometido; mas manda-a para casa com fortes recomendações de nunca mais tornar a pecar...Eis, um Advogado que veio condenar não o pecador, mas o pecado, ao contrário do que era comum na cultura judaica.

6. Mais ainda: a cultura judaica era profundamente machista. Ora bem: não tendo a mulher cometido adultério sozinha, onde esteve o homem que com ela cometeu tal pecado? Sabemos que, de acordo com a mesma Lei, o homem poderia repudiar a sua esposa infiel, ao contrário da mulher que sofria as mais hediondas sevícias: estava-se, como era óbvio, diante de uma lei opressora, que violava os Direitos Humanos e a dignidade da mulher...

No seu livro “África Renascida”, Dom Francisco da Matta Mourisca diz que as mulheres pecadoras eram desprezadas até por aqueles que as prostituíam, a exemplo da Mulher Adúltera, imortalizada nas páginas do Evangelho. Ora, dizia o Bispo do Uíje, «o único homem que podia atirar pedras à mulher, porque não tinha pecado, foi o único que a salvou das pedras- o próprio Jesus. Retrato comovente da figura de Cristo, que veio salvar o que estava perdido: não só o homem senão também a mulher».


Por Pê. António Estévão


sexta-feira, abril 20, 2007

IMAGENS DE LUANDA

A ferocidade da vida caminha a passos largos com a pobreza. São visíveis a olho nu, nas ruas de Luanda, nas paragens de candongueiros, nos autocarros e nas longas filas de marchantes imagens que nos lembram filas intermináveis de contratados e escravos do sertão ao embarcadouro.

Escravos sim. Duma vida que vê degradados os seus valores mais elementares como o humanismo, a solidariedade e o amor ao próximo. Apenas de forma isolada nos “surpreendemos” com gestos amistosos de quem deixa a cadeira para um idoso, a uma mulher grávida ou com criança ao colo, ou ainda o apaziguamento de uma contenda.

Acabei de ver um sujeito das FAA a esmurrar em plena luz e sem causa aparente um jovem que por sinal até se dirigia à oficina em que trabalhava. Motivo: Escorregou na lama que encobria o asfalto e tocou-lhe na farda.

Desumanamente todos passamos. Ninguém socorreu o jovem que sangrava nas narinas. Também ninguém repreendeu o sargento.

Soberano Canhanga

quinta-feira, abril 12, 2007

CULTURA COKWE EM SAURIMO

DE PEDRA E CAL
A pouco menos de dez quilómetros da cidade capital da Lunda –sul, Saurimo, está a aldeia do Luari. Entre nativos e deslocados, forçados pela guerra a abandonar as suas comunidades rurais no interior da província, Luari é hoje uma aldeia com mais de duzentas famílias camponesas que tudo fazem para perpetuar a cultura Lunda- Cokwe.

A mandioca, a ginguba (amendoim), o feijão e o milho são as principais culturas, sendo a pesca e a caça actividades complementares à dieta e ao lazer, ao mesmo tempo que se ensaiam outros produtos destinados à venda, como o abacaxi e o abacate, muito procurados pelas empresas que actuam na região.

Junto à aldeia, cresce um complexo turístico - Ciseke - que conta com uma esplanada e casas de campo, estando em construção um motel.

Informações recebidas no local dão conta que os antigos moradores de um ex-internato, em escombros, e os das casas vizinhas, serão deslocados, para dar lugar à construção de um motel, valorizando a área envolvente a uma atractiva lagoa natural .

“Já nos disseram que o Mwata comprou mais de três mil chapas de zinco para cobrir as nossas casas e também vamos poder trabalhar aqui mesmo quando ele precisar", referiu-nos um ancião, contactado no local,tendo-se escusado a apontar o nome do empreendedor e sequer o seu .

Fontes anónimas atribuem o empreendimento Txisseque ao actual Governador, Miji Itengo, tendo no âmbito da responsabilidade social da sua empresa, já erguido um estabelecimento escolar na comunidade .

Dia após dia a comunidade do Luari assiste à mudança para melhor do ambiente circundante adivinhando-se até dias ainda mais prósperos, já que "há empregos à vista”. Entretanto, o que não sofre alteração, mesmo sob a pressão da aculturação, é o modo de vida do seu povo. A principal referencia é o ritual da festa de iniciação, masculina e feminina - Mukanda wa Kandandji e Mukanda wa Pwo - que vêem sendo passados de geração em geração.

“Estar no Luari é estar com a nossa cultura”, afirmou Pedro Sacahumba, secretário do bairro.

Ritos como o Mukixe e o Kandangi (máscaras) e Cianda (dança tradicional), entre outros, são ensaiados de forma organizada e pedagógica, pela sociedade que pensa deste modo perpetuar os valores característicos à peculiaridade da sua cultura.

Crianças, ainda de tenra idade, ensaiam diligentemente os passos das danças e rituais que conferem original singularidade à sua cultura.

“Assim como fazem os nossos pais, nós também estamos a aprender para depois ensinar aos mais pequenos", confidenciou-nos Fernando Nuati, um adolescente que fazia o papel de comandante de dança Muquixe, rigorosamente mascarado .

Para Avelino Carlos - Muanga-saia - líder musical dos Astros da Lunda-sul “apesar da influência de outras culturas divulgadas pela televisão, a cultura Cokwe está intacta e como a aprendizagem acontece sempre na comunidade com os mais velhos não há nada que a afecta”. Disse acrescentando que tem sido função dos mais velhos, esmerarem-se na forma como acompanham a continuidade na execução dos ritos e máscaras pelos mais novos, preservando a sua pureza e integridade.

“Até agora continuamos a fazer a circuncisão que demora seis meses a um ano. As meninas também têm um ritual parecido e é aqui que se passam todos os valores". Concluiu.

Segundo, Ana C. G. Marques*, "entre os cokwe, as máscaras não são um disfarce mas sim uma instituição que contribui para a perpetuação das diligências sociais e Culturais, um veiculo de transmissão do conhecimento colectivo, a negociação das magnas preocupações e aspirações humanas. Através dela celebram-se a esposa, a irmã e a mãe, declarando-se a autoridade e o papel moderador da mulher na sociedade.

Mwana pwo é uma máscara confeccionada em madeira para a realização de rituais de passagem da puberdade. Na sociedade tradicional cokwe, a comunidade junta-se no centro da aldeia para assistir à mascara mwana pwo dançar, ela representa o ancestral feminino. A seu lado as mulheres aprendem as boas maneiras, os princípios éticos e a solenidade com que se devem impor na sociedade".

A sociedade cokwe sempre preservou a consciência colectiva da sua identidade histórico-cultural, através dos seus mitos de origens e de outras marcas culturais.

*(MARQUES, A.C. Guerra, http://tucokwe.org, acesso e correcção aos 26.06.2009)
Luciano Canhanga (licenciando em Ensino da História pelo ISCED/Luanda)

terça-feira, abril 10, 2007

MEMÓRIAS DO LUENA E DA PAZ

No Moxico após a Morte de Savimbi
Tarde de 22 de Fevereiro de 2002. Trabalho à tarde na LAC e peço a Editora Paula Simons que me dispense para resolver um assunto doméstico a partir das 17 horas. Assim acontece. Rumo ao Rangel e depois ao bairro da Cuca com o João Manuel. Deslocamo-nos à casa do Aires, sobrinho dele e agora meu afilhado. Não o tendo encontrado decidimos procurar o Zé Ndonga que tinha ido ver a namorada no Tala Hadi.

Pelo caminho recitamos uma antiga propaganda radiofónica cantada em Umbundo. “Ove a Savimbi etaly tua ku kuata…” continuando com o “Agarra Savimbi, Kuata… agarra…” Era tão alto o sentimento de insatisfação pela guerra que o homem levava a cabo com queima de comboio à mistura.

De repente ouvem-se tiros vindos de todos os lados. Tentamos procurar refúgio e não havia. Multidões invadiam os candongueiros no Zamba I para se esconder dos tiros. Era hora do Angola no Coração, programa da RNA que sucedeu ao Angola Combatente. Não tardou a notícia e o delírio. É Savimbi… O Savimbi morreu! Festa total em Luanda.

O percurso ao Tala Hadi e depois ao Rangel foram feitos em táxis mas sob fortes disparos anárquicos que foram travados com apelos na rádio. Festa sim, mas aos tiros não. O povo estava eufórico e mesmo assim pouquíssimos foram à cadeia.
Ida ao Luena
Uma semana mais tarde sou apontado pelo Editor-Chefe da LAC, Ismael Mateus e pela Editora da Manhã, Paula Simons, para ir ao Luena, capital do Moxico, ver como estava a situação humanitária das centenas de milhares de pessoas que vinham das matas. Homens, mulheres e crianças que viveram à sobra da UNITA e de Savimbi e que voltavam à cidade, muitos pela primeira vez, desprovidos de tudo. Em Luanda havia uma outra UNITA, a Renovada que lutava pelo controlo efectivo do partido mas sem arcaboiço, já que a praxis dita que a paz militar faz-se com os feitores da guerra.

Ao Luena chegavam todos os dias mais de mil indivíduos desprovidos de tudo. Piolhentos, (até Lukamba Gato, secretário-geral da UNITA de então, estava igualmente roto e desnutrido), esfarrapados, diarreicos, enfim. Clima desolador e constrangedor para um ser humano. Foram estas as imagens que reportei, alojado em casa de uns amigos do PAM que arranjei no local. Aliás a boleia ao Moxico foi num avião ligeiro do PAM.

Nas matas, e com Savimbi morto, decorriam os contactos exploratórios entre as FAA que tinham um Estado-Maior avançado no Luena e os sobreviventes militares das colunas rebeldes em que despontavam Abreu Kamorteiro e Gato. Nessa altura a TPA mostra imagens do primeiro encontro entre oficiais superiores da Forças armadas angolanas e Kamorteiro, chefe de estado-maior das forças militares da Unita, a que se seguiu um outro encontro com participação de Lukamba Gato. Um Gato cabeludo e piolhento que falava a um telefone IRIDIUM que lhe tinha sido emprestado por uma alta patente das FAA.

As imagens sonoras emitidas, a partir do Luena, proporcionaram-me conhecimentos sobre a situação dos que vinham das matas, a quantidade de pessoas que viviam à sombra do líder rebelde, como também me conferiram alguma respeitabilidade entre os colegas de redacção, chefias e outros jornalistas. Não eram tantos os jornalistas que tinham tido a minha experiência recente.

Cobertura das negociações FAA/FMUnita
Um mês depois da morte de Savimbi as “negociações” passaram das matas para a cidade do Luena. Algumas roupas usadas (de fardo) foram oferecidas de emergência aos líderes da UNITA provenientes do “Maquis” como Marcial Dachala, Alcides Sakala Simões, Lukamba Gato (secretário-geral), os generais Wambo Kalunga, Samuel Chiwale, Black Power (João Baptista Tchindadi), entre outros, todos rotos e desnutridos. Bem nutrido estava apenas o general Apolo que comandara a frente norte (Bengo, Uige) e tido como o autor do ataque ao Comboio no Zenza do Itombe.

Foi este o clima que encontrei. Uma carta de recomendação do Director de Informação José Rodrigues ao general Nunda, Chefe de Estado-Maior adjunto das FAA para que me fosse dado “apoio informativo”, enquanto fonte. As conferências de imprensa aconteciam na sede do Governo Provincial, porém as “negociações” entre as partes aconteciam no Estado-Maior avançado das FAA, onde ninguém da imprensa tinha acesso, embora se passassem a imagens de que era tudo no governo.
A entrevista com Generais da UNITA
Meio vestidos e meio calçados ou seja, Farda gasta pelas lavagens e caminhadas e calçando chinelos num quarto fortemente guarnecido por uma tropa esfarrapada e desabituada ao tratamento cortês citadino, e sob elevados níveis de alcoolémia, foi neste ambiente que conheci o general Kamorteiro, na pensão Horizonte (?) e outros chefes militares da UNITA como Samuel Chiwale, Wambo Kalunga, entre outros a quem pedi uma entrevista que me foi dada no dia seguinte.

O clima parecia ameno, não fossem aqueles miseráveis deslocados que chegavam todos os dias das matas rebentando até às costuras uma cidade de si já empobrecida.
Naqueles dias de fome para milhares já Kamorteiro se fazia passear num Jeep Hiunday Santa fé entregando-se apaixonadamente ao Wisky e sempre com um filho menor ao lado. Dias depois, numa hora seis da manhã, viria a partir o carro, embatendo contra uma árvore duma rua larguíssima do Luena. Quanto ao consumo desesperado de álcool, os seus subordinados, também generais, não se deixavam ficar atrás. Ao gargalo e muito Wisky. Foi nesse ambiente que fui recebido num dos quartos da pensão pelos generais Chiwale e Wambo para a primeira entrevista à LAC, dos sobreviventes da coluna. Foi um sucesso em Luanda.

Conselho Nacional da Família
Depois da assinatura do memorando de entendimento entre as partes militares, que já estavam em trégua ordenada pelo governo, inicialmente no Luena e depois, a 4 de Abril na Assembleia nacional em Luanda, Luena tornou-se o centro das atenções dos políticos. Em Maio de 2002 o Ministério da família e Promoção da Mulher decide realizar no Luena o seu Conselho Nacional da família em que participaram representantes de todas as franjas da sociedade. Foi a minha terceira estada, por uma semana, na capital do Moxico, aproveitada para outras reportagens sobre a situação humanitária que continuava preocupante.

As “amizades”
Todo o que se seguiu foi apenas um conhecimento sobre a vida política de então, a UNITA e seus dirigentes bem como os contornos que se seguiram à paz. Assistiu-se à luta pelo poder civil na UNITA entre os partidários de Gato (os da mata) e Manuvakola (os da cidade ou Renovada) com vitória dos da mata e depois a batalha pelo controlo da bancada parlamentar que resultou no afastamento “compulsivo” de Filipe Chimpolo e sua substituição por Gerónimo Wanga, bem como o polémico desvio de milhões de dólares por parte de Lukamba Gato já nas vestes de coordenador da comissão de gestão do partido do galo negro que desembocou numa sindicância.

Os desenvolvimentos seguintes foram os congressos, primeiro da UNITA, depois o do MPLA e mais tarde o da FNLA (o dito da reconciliação, mas marcado por cenas de pancadaria entre partidários de Holden e Ngonda).

A província do Moxico ocupa uma área de 223.033 quilómetros quadrados, a maior do país. Está localizado no centro leste de Angola, fazendo fronteiras, a Norte com a província da Lunda-Sul, a Sul com Kwando Kubango, a Nordeste com a República Democrática do Congo, a Leste e Sudeste com a Zâmbia e a Oeste com a província do Bié. Moxico tem um clima tropical húmido com duas estações principais (chuvosa e seca). O seu subsolo virgem com os seus recursos minerais, tais como: cobre, carvão, manganês, diamantes, urânio, volfrâmio, ferro, estanho e o molibdénio, o mel, a acera e a pesca artesanal. A agricultura, piscicultura, apicultura e a exploração de madeira são potencialidades económicas. A população do Moxico subdivide-se por várias etnias, nomeadamente Luvale, Cokwe, Bundas, Luchazes, Umbundo e Lunda-Dembos. A sua população estima-se em 800.820 mil habitantes. A província controla dois mil e 643 autoridades tradicionais, exercendo as suas actividades em conformidade com a realidade político-administrativa do país.

Soberano Canhanga

segunda-feira, abril 02, 2007

PERGUNTA D'ABRIL: BODAS DE BRONZE VIDA DE BRONZE?

Com pendentes ainda por resolver entre os antigos contendores, Angola assinala no dia 4 de Abril 5 anos da sua mais prolongada paz militar, depois da independência a 11 de Novembro de 1975.

4 de Abril, dia da assinatura do memorando complementar aos acordos de Lusaka (20 de Nov. 1994) foi consagrado à paz e reconciliação nacional.

-Da paz militar à paz social que distância nos falta?
-Bodas de bronze é já vida de bronze?


Soberano Canhanga