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quinta-feira, fevereiro 28, 2008

PEDRA ESCRITA (LIBOLO): NOTAS ESPARSAS I


Aldeia de Pedra Escrita, 279 Km de Luanda, Estrada Nacional 120, há meio caminho entre Dondo e Kibala.

O fim da guerra serviu para juntar os vários povoados que se espalhavam pela região, numa extensão de aproximadamente 10 Km. A fusão é atribuída ao Tenente Coronel Infeliz, n’altura Comandante do Regimento das Forças Armadas estacionadas no município.

  • Conta-se que os aldeões foram forçados a abandonar as residências permanentes nas lavras e formar uma aldeia unificada, o que por si só pode resultar em muitos ganhos colectivos. Hoje, todos se orgulham deste facto, na altura mal encarado.

  • Habitantes de aldeias mais distanciadas da estrada asfaltada seguiram o exemplo dado pelos seus familiares, ainda nos anos oitenta do século XX, fazendo da Pedra Escrita uma das maiores aldeias da Comuna da Munenga, Município do Libolo.
  • Cálculos demográficos apontam para cerca de mil famílias que multiplicado pelo número de agregado, variável entre 5 a 7 indivíduos, nos dá a ideia de poder contar com uma média de 5 a 7 mil habitantes.
  • Para quem viveu na Pedra Escrita ou que lá tenha nascido, mas que há muito deixou de lá viver, o reencontro com a comunidade é sempre motivo de regozijo, quanto mais reencontrar uma aldeia que cresceu demográfica e economicamente. O fim da guerra e a consequente sedentarização permite hoje às famílias construir casas semi-permanentes, juntar alguns recursos e adquirir meios como: chapas de zinco, móveis, electro-domésticos, geradores, motorizadas e até viaturas, algo inimaginável no passado.
  • Porém, se nesse aspecto a comunidade parece ter evoluído, há aspectos em que a colectividade regrediu. Reporto-me à educação, cuidados médicos e sanidade do meio e outras preocupações comunitárias. É que não existem escolas, posto médico, latrinas nem espaços de lazer público.

    No passado, a que assisti como beneficiário, eram as comunidades que construiam a escola, cabendo ao comissariado comunal a indicação do professor que pelo facto de a sua actividade permanente ser o ensino, era alimentado pela comunidade.

  • E mais. Enquanto as nossas mães contribuíam com alguns alimentos, nós os alunos efectuávamos campanhas aos sábados na pequena lavra do professor, encurtando desta feita a sua dependência alimentar da comunidade.

  • Hoje, mesmo com a aldeia triplicada, estas iniciativas desapareceram. Escola, posto médico, Jango comunitário, fontanário, casas de banho e latrinas familiares e ou colectivas afiguram-se como necessidade urgente para diminuir doenças como as diarreias, bilharzioze, entre outras, educar as crianças, alfabetizar os adultos e tratar dos detritos, etc. Iniciativas comunitárias podem encorajar ONG e outros doadores à causa.

  • Repousam-me ainda na memória os quilómetros percorridos, à pé, da Fazenda Israel ao Calombo, do Rimbe à Fazenda Israel, do Rimbe ao que é hoje a aldeia de Pedra Escrita, entre outras peripécias, sempre à procura do aprimoramento intelectual. São distâncias que as crianças de hoje não têm necessidade de percorrer,dada a fusão dos aglomerados populacionais que circundavam a Fazenda Israel. Porém, falta a organização que tiveram os pais do antigamente, já que hoje, os mais pequenos perdem a possibilidade de usufruir de um dos seus direitos mais elementares, a educação.

  • Os pais de ontem já estão sem forças ou já se foram. E por incrível que pareça, os pais de "hoje em dia" esqueceram-se que têm de dar formação aos seus rebentos, sentam-se à sombra da bananeira apreciando um "bom" Kaporroto de dondi.
  • É pena que falte por lá quem provoque um debate e se encontre, sobretudo, "quem coloque o sino ao pescoço do gato". Enfim, falta organização e iniciativas por parte dos aldeões, um facto que deixa entristecido quem por lá tenha nascido e ou vivido e que, por amor ao cordão, anseia por uma vida digna aos seus.

  • Luciano Canhanga

1 comentário:

Anónimo disse...

É muito bom encontrar um texto que retrata uma aldeia por onde passei agradáveis momentos da minha infância e adolescência, ainda que cortados pela formação em Munenga e Calulo. Vivas ao autor desta página. Finalmente as que estão talhados para a grafia se deram conta que literatura é tudo isso. O retrato do país, quer sejam os bons feitos quer os maus.