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sexta-feira, março 01, 2013

A MINHA QUASE MÃE

Eu
Trinta e um anos depois, nunca me passou pela cabeça descobri uma das façanhas, ainda inauditas, do meu finado pai. Ele era um homem de poucos amigos embora bastante social e aberto. Por isso não conheci os seus amigos de infância, adolescencia ou mesmo da juventude. Apenas aqueles que nos rodeavam quando comecei a me reconhecer como homem pensante. E, pior, porque aos 8 anos vi-o partir para nunca mais, sem tempo para colocar-lhe questões pertinentes sobre os seus tempos de juventude e aventuras da mocidade.
A 13 de fevereiro de 2013, cruzei com uma senhora, na casa dos sessenta ou mais anos, que me disse tachativamente que por um pouco eu seria filho dela.
E, brincava ela, que se tal acontecesse eu seria clarinho como ela…
Intrigado, perguntei se como seria possivel tal situação, eu filho dela e ela minha mãe.
E não demorou para retirar da lúcida memória:
- Tu és neto de Ngana Muriangu “Kaphuku”?
- Sim, mãe. Ainda conheci o pai do meu pai.
- Também sabes que na adolescência o teu pai se havia alcunhado de Chico?
- Sim. Soube disso já no óbito, em 1982. Um primo dele pronunciava António Chico ao se referir ao falecido. Ninguém mais sabia desse nome senão ele. Deduzi que fora uma alcunha do meu pai.
António Fernando Dambi (1940-1982)
- Já alguém te contou que antes da tua “mãe grande” (referia-se à mãe dos meus irmãos mais velhos), o teu pai teve uma mulher?
- Não, mãe (passei a tratá-la por mãe para buscar maior empatia e ela estava a gostar). Apenas sabia que tinha pretendido uma mulher antes de formar família com a mãe dos meus irmãos mais velhos.
A Senhora, alta e não muito forte, vigorosa e um pouco vaidosa,  passou a sua mão, já rugosa, mas cheia de força, sobre a minha cabeça, puxou um suspiro e disse na língua que melhor domina:
- Andono Chico, eme ngi mungaj´é ú sombili (Eu fui a primeira mulher do António Chico).
A mulher discursava na variante kimbundu que se fala na Kibala (K-Sul) e eu em português. Entendíamo-nos bem, pois eu, embora não domine a oratória da língua Bantu, percebo-a. E continuei.
- Porque não ficaram juntos? Eu também queria ser claro e alegre como você. Ironizei.
- Pois é (sempre em kimbundu da kibala), eu, na adolescência, quando nos juntamos, adoecia muito e o teu avô decidiu que devíamos nos separar. Foi por isso que ele arranjou a kimbangala e eu também “amiguei” com outra pessoa.

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