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quarta-feira, fevereiro 22, 2017

MAKA NA SANZALA


Os três primeiros dias foram de experiência e não havia limitação de acesso. Homens e mulheres trilharam o caminho da piscina fluvial que dista a meio quilómetro da aldeia. Porém, ninguém retirava as roupas para provar a água, com excepção das crianças que não se coibiam em mergulhar, mesmo vestidas, ludibriando os mais velhos que não saiam do ver e imaginar aquele tanque a amansar o corpo ardente em dias de calor intenso. Enquanto o Mangodinho não tocasse o apito de partida, os homens e as mulheres adultas ficavam só a nadar com os olhos.
Festa grande acontecia mesmo no coração de Mangodinho que no seu canto festejava o feito que quase lhe custou o epíteto de louco.
Com os homens já a frequentar regularmente o sítio, algumas mulheres decidiram experimentar também a piscina, se bem que à revelia.
- Mana Cati, fica na montanha a ver se vem alguém. Se estiver a vir homem, assobia. Depois será a tua vez de experimentar a lagoa do Mangodinho. - Combinaram as mulheres que tinham Kilombo na linha da frente.
Mangodinho até estava a pensar em estabelecer horários para homens e mulheres frequentarem a e limparem a piscina, mas, aquelas fraldas deixadas às pressas por mulheres que se foram lavar no sítio dos homens deixaram-no enfurecido.
- Possas, esse abuso não. Essas senhoras, assim, na capital não vivem. São corridas. Um gajo tenta civilizar e ainda recebe "adubo" de agradecimento? - Vociferou. - Miúdo Russo, você viu a chacota que me fizeram. Todos me diziam "Zequeno é xoné". Você, por me apoiar, também apanhaste por tabela. Agora que o lugar está bem, surgem cavalonas a deixar porcaria na "peixina" e, ainda por cima, a mandar vir? Escreve só, por favor, nessa chapa o que te vou ditar.
Foi assim que Mangodinho pregou a chapa no barrote que plantou a trinta metros do rio, concretamente, no sítio em que as mulheres faziam plantão para espionar se vinha homem da aldeia. Mas as mamãs da OSA, organização das senhoras angolanas, queriam "tratamento igual".
- Não pode ser. Ou as mulheres frequentam a piscina de manhã: tomam banho, lavam os filhos e vão cuidar dos maridos e dos velhos ou os homens tomam banho à tarde, quando vêm dos seus afazeres. O Estado já disse que os direitos têm de ser iguais, senão vamos 'se' queixar no Quem-de-direito. - Ameaçou Kilombo, a senhora coordenadora da OSA.
Toneco Avelino, o responsável máximo da aldeia, a quem se deviam "subordinar" todas as organizações sociais, tinha um assunto bicudo.
Mangodinho tinha razão dele. O próprio Toneco tinha depositado algum descrédito quando lhe foi apresentada a ideia da lagoa. Apenas deixou acontecer para não refrear as ideias quentes que o homem trouxe da Ngwimbi e não prejudicar a revolução na aldeia. Era lema dele. Toneco apelava sempre “quem vai a uma terra distante, mais avançada do que a nossa, tem de trazer outras ideias que nos façam evoluir”. Dizia também, não sei quem lhe pôs tal ideia na cabeça, que “mesmo Luanda, quando começou, também era uma aldeia como a nossa. Apenas as pessoas é que evoluíram e começaram a fazer coisas novas e bonitas”. Por isso, deixou o Mangodinho avançar com a ideia dele da piscina no rio.
- No dia em que encontrou fraldas à beira da piscina e outros filtros usados somente pela camada feminina, esses objectos foram-me apresentados e estão devidamente registados e depositados em sítio localizável. Está a camarada Kilombo a solicitar reunião urgente. Que fazer? Assim digo que o Mangodinho tem razão dele ou as mulheres é que reclamam com razão?
Toneco foi dormir com cabeça quente. Tem de se acalmar para resolver o assunto que está a dividir a mana Kilombo, o Mangodinho e todos os apoiantes de cada ala.

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