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quinta-feira, junho 29, 2017

MBANZA-A-KONGO: MEMÓRIAS DE REPÓRTER

MEMÓRIAS DE REPÓRTER

Março, 31, de 2005. Samakuva vai a Mbanza a Kongo em actividade político partidária. Cacique Pena, seu director de Protocolo convida a média para acompanhar a delegação. Folha 8, LAC, jornal de Angola, entre outros media dizem sim. Chegados à antiga cidade de São salvador do Kongo, já tarde avançada, a única pensão, que chamavam de hotel, estava com os quartos todos ocupados. Disseram aos jornalistas que foi uma "partida" montada por um rival político.
 
Sem espaço no "Hotel Kongo" tivemos de nos contentar em conhecer  o Yalakuhu e o Nkulumbibi que ficam aí ao lado e sermos, depois, alojados num albergue duma bwala qualquer onde as camas eram feitas de paus e os cobertores repletos de percevejos. Aquilo era insuportável e tivemos de voltar ao "hotel" e ocupar os sofás da sala de recepção e outros que se achavam nos corredores da instituição.

Dia seguinte, 01 de Abril, viagem a Cuimba, município interior. A picada, acidentada e lamacenta, era um "cemitério" para os carros. Dois camiões militares de marca URAL seguiam um à frente, para puxar as viaturas ligeiras que atolassem, e outro seguia à retaguarda para a mesma empreitada.
Pelo caminho, não foram poucas as intempéries. Chuva farta, lodaçal, carros que ficavam pelo caminho, mas a comitiva fez-se ao Cuimba onde os políticos se explicaram e prometeram o que levavam na bagagem.

Quando o sol se despedia, Samakuva e a sua equipa também se despediam do Cuimba, tendo como cicerone Marques Ntiama que chefiava o galo negro no Zaire.
Pior do que a ida foi o regresso. Metade da "frota" ficou pelo caminho, atolada na lama. Um dos camiões de marca URAL que serviam para arrastar os ligeiros que se atolassem também ficou encalhado na lama. Nas subidas, as Pickup pareciam bagres deslizando em ziguezague sobre o solo escorregadio. Passageiros de viaturas deixadas para trás arrojavam-se ao colo de outras pessoas nas carroças fustigadas pela chuva intrépida. Gripe? Sim senhor. Gripe, outras dores e tristezas viriam mais tarde.

No dia seguinte, 02 de Abril,  recebíamos a má nova sobre a morte  do papa João Paulo II.

Texto publicado no jornal Nova Gazeta, 06/07/17

segunda-feira, junho 26, 2017

A TODOS O SOL

Uns procuram sol para acrescentar luz ao seu brilho
 

Outros reclamam sol para acelerar a sua putrefacção.
 

Dai a todos sol!

quinta-feira, junho 22, 2017

PENÚLTIMO RECÚO

Depois de terem "varrido" literalmente o Kisongo, Kisala e cercanias, roubando o gado que puderam levar, devastado lavras, raptado jovens para ingressar suas fileiras, violado e esposado forçosamente raparigas, deixando as aldeias despovoadas, pois o povo começou a recuar, em finais de 1983 chegou a desgraça às aldeias da comuna libolense da Munenga.

Depois do ataque a viaturas junto à fazenda Kangulu, e accionamento de mina por parte de um tractor a serviço da Estalagem Boa Viagem-Lususu, procedente do Alto Dondo, levando à morte o nosso benquisto Santos Kajamba, começamos a recuar. Inicialmente para Fuke, junto à fazenda e Motel do alemão Walter Kruk (raptado após ataque à Munenga), onde permanecemos uma semana. O trajecto de aproximadamente 20 quilómetros era feito a pé, pés descalços, em atalhos abertos na densa vegetação ou sob o sol escaldante que derretia o alcatrão na rodovia asfaltada.

Chegou o mês de Fevereiro de 1984. Saídos do Limbe, próximo da actual aldeia de Pedra Escrita, estávamos "RECUADOS" (deslocados) uma semana nas lavras de Katoto, margens do rio Ryaha, antes de emprestar as suas águas ao Sangisa.

O percurso fora feito a pé, seguindo o leito caudaloso do rio Ryaha para não deixar trilho que desse pistas a quem fugíamos (UNITA). Eramos seis ou sete famílias mal acampadas. Uma semana depois, os víveres foram escasseando e a paciência dos que nos acolhiam (da parte de uma nora) se ia esgotando. Não havia como tal não acontecer.

Os mais velhos (papá Xika Yangu à cabeça) iam fazendo uns raids ao Limbe em busca de comida. Outros iam à caça. Porém, António Neto, o seu irmão mais novo Sabalu e um primo foram raptados e, tempos depois nas bases da UNITA, apenas o Sabalu regressou. O irmão mais velho e o primo foram mortos por alegada tentativa de fuga.

Sem comida de origem vegetal e sem que os mais velhos pudessem ir à caça, os cabeça-de-família resolveram que deveríamos "recuar" um pouco mais, desta vez para a sede comunal da Munenga. A comitiva fugitiva abrigar-se-ia em casa de Manuel Albano, um parente que se achava em condições mínimas de nos receber e suportar por algum tempo, até que a situação na procedência normalizasse.

No dia da chegada, Manuel Albano havia conseguido apanhar nas suas armadilhas um veado macho. Ao jantar, saboreámos a jinginga (miudeza) e a carne ficou em defumação para que não se estragasse. Seria consumida nos dias vindouros. Para além da carne, havia na cozinha, onde o mano Sabalu-a-Soba e eu dormitamos, óleo de palma e outros mantimentos trazidos e encontrados. Calculo que kapuka também.

Na mesma tarde, um sanitário da Swapo que ajudavam na guarnição do vilarejo fez-me curativo a uma ferida na perna que já ia deitando odor estranho. De recúo em recúo não havia atenção para pequenos detalhes e até a saúde ficava em plano secundário. Tive um tratamento único: desinfecção com álcool, mercurocromo, antibiótico e um penso. A ferida secaria dias depois.
Naquela dia em que aportámos à Munenga nada fazia adivinhar um ataque rebelde. Vivia-se em paz, apesar dos zum-zum. A guerra dos nossos ouvidos e conhecimento era no Kisongo, Kisala e Kariangu. Pensava-se que a presença dos rebeldes nas cercanias de Lususu era por causa do gado trazido pelos recuas das aldeias já devastadas. Na Munenga, as pessoas andavam e conversavam sem grandes receios. Pelo menos as crianças estavam inocentes.
Na noite que antecedeu os acontecimentos, as luzes no comissariado estavam acesas. À madrugada, o tiroteio começou pelos lados do comissariado. Tiros de pistola, inicialmente. Depois, armas ligeiras de maior calibre. rajadas de cortar a respiração. Depois obuses fazendo soltar mijo aos medrosos. As FAPLA e SWAPO resistiram até onde puderam. Os rebeldes tinham chegado em maioria de homens e força. Havia mulheres que batucavam enquanto os homens faziam rajadas contra tudo. A guarnição do comissariado recuou. Seguiu-se fogo e fumo. Todas as casas foram, depois, passadas "à revista". Mortes, raptos e choros tomaram conta do ambiente. O ataque estava consumado. Os que sobraram vivos fizeram dois caminhos. Munenga ficou evacuada para o Dondo e Samba Karinje (a caminho de Kalulu) onde ficamos recuados mais um mês, tendo o pão como principal alimento, até que a farinha de trigo se esgotou.
As mamãs e papás, havia pouco tempo abastados, viram-se forçados a trabalhar por comida em lavras de aldeões locais.
Luanda seria o próximo recúo. temerosos, voltámos ao Limbe para reunir apressadamente as condições mínimas de viagem. Chegou Maio de 1984 deixei o Limbe, Munenga e Libolo, depois de termos ido a Kalulu pedir guias de marcha para a capital do país...

domingo, junho 18, 2017

IMUA-CALEMBA Vs IECA

Que há em comum?
 
Gostaria de perceber melhor a ligação (in)existente entre aquela casa de adoração cristã dos Metodistas Unidos, a igreja/templo ou cargo pastoral de Calemba e a cristã IECA (Igreja Evangélica Congregacional de Angola).
 
Quando em 1984 cheguei a Luanda, o meu tio Ferreira Nganga frequentava a Metodista de Calemba, no bairro do "cemitério novo". Só depois passei ao templo Moisés, antiga classe (Kwanza-Sul) da Calemba que acabara de se autonomizar em Setembro do ano anterior.
 
Hoje (18/06/17) fui a uma IECA e senti-me como se estivesse na Calemba. O entoar dos hinos, os adornos interiores, as vozes arrastadas das mamães de origem ovimbundu, etc. tudo parecido, até o recitar do "Pai Nosso e Credo Apostólico". Fui à IECA mas senti-me no templo Calemba da Igreja Metodista Unida.
 
Em tempos, não muito recuados, os pastores de ambas as congregações (IECA e IMUA) frequentavam mesmos institutos teológicos como o Emmanuel Unido, no Dondi (pertencente à IERCA) e Quessua, em Malanje (pertencente à IMUA). Foi-me contado que o Bispo emérito da IMUA S. Reverendíssima Emílio de Carvalho já foi professor e reitor do Seminário Emanuel, na Missão do Dondi Angola (1965-1972).
 

Reacções
 
R1:"Meu irmão Canhanga, na verdade, a Igreja (Metodista Unida) de Calemba pertencia à IECA. Devido a localização das sedes da Metodista em Luanda e IECA talvez em Benguela, o secretário geral da IECA tinha pedido ao Bispo Emílio para superintender a igreja Calemba em Luanda. Com passar do tempo e porque o Bispo Emílio nomeava pastores Metodistas para (Calemba/IECA) a mesma automaticamente passou a ser Metodista. Com alguns (eventuais) erros essa é parte da história que sei em relação a esse assunto" (Francisco Quitembo).

R2: Caro Canhanga, em 2008, no âmbito da escrita da história da Igreja Moisés, havia questionado o Bispo Emílio de Carvalho sobre a relação da Igreja Metodista Unida Calemba com  IECA, tendo respondido: "a IECA nunca teve congregações na cidade de Luanda antes de 1974. Nesse ano, havia apenas três igrejas de expressão 'umbundu' em Luanda -Calemba, Nova Estrela e Betânia. Quando nesse mesmo ano essas três igrejas, em carta de 15 de Maio de 1974 assinada pelos seus pastores e leigos, pediam que as congregações desta expressão e seus três pastores fossem autorizadas a pertencerem ao Conselho das Igrejas Evangélicas de Angola Central. Esse pedido  nunca foi autorizado pela Igreja Metodista Unida de que eram e são parte. Um dos seus pastores pertencia a esta Igreja (IECA), outros dois haviam sido solicitados pela IMUA para virem a Luanda a fim de ministrarem aos Metodistas de expressão 'umbundu', dado os acordos de cooperação já existentes entre ambas Igrejas: a Igreja de Calemba nunca foi parte da Igreja Congregacional em Angola". Espero ter contribuído para o esclarecimento, de forma documental, desse equívoco (Carlos Cabombo).
 

quinta-feira, junho 15, 2017

A REVOLUÇÃO COM PEIXE E FUBA

Quando Phande e a mãe Katumbu chegaram a Luanda, em Maio de 1984, "recuados" da guerra no Lubolo, ela  vendia fuba à porta de casa, na rua de Ambaca, no espaço conhecido como Kalisange. O produto tanto servia para confeccionar a janta, como dava o dinheiro para comprar peixe, conduto vendido na praça das Corridas e ou no Tunga Ngó. A primeira praça ficava no Rangel, junto ao Supermercado Nzala Ikola e a segunda em território doCazenga, pois encravava-se entre a linha férrea e o quintal das Oficinas Gerais, a espreitar a Escola nº 5. A praça do Tunga Ngó era informal, sem bancadas e com "gregos" à mão de semear.
 
Katumbu, a caminho dos quarenta anos, viúva refugiada, quatro filos menores, ia manhã cedo com as colegas depobreza a uns armazéns onde se vendia (desviava) milho e masa-a-mbala. Ao filho mais velho, Phande, cabia levar os grãos à moagem de onde vinha a confundir-se com a própria fuba. 
 
Vezes tantas ele "aviava" também a negócio da mãe quando essa fosse comprar outros grãos  e não fosse dia ou hora de escola. E quando os odepés e bepevês faziam as suas rusgas para levar o ganha funge da família, a astúcia de levantar a bacia e correr para o quintal estava-lhe nas pernas. Phande era como o sardão que não anda às voltas.
 
Aos sábados, dia de honga, caminhavam, mãe e filho, a pé. Rangel, Karyangu, Palanca, Sanatório, Kapolo, até  chegarem à honga, campo agrícola, na zona militar do Kapolo, onde se  cultivavam mandioca, batata-doce, abóboras, jinguba, kingombo (quiabos), makunde (feijão frade), feijão, jimboa, etc. Parte da colheita  ia ao estómago e outra trocada por dinheiro. 
 
A apanha de katatu (lagartas) em folhas de ditumbate era a brincadeira que Phande mais gostava nas idas à honga. Também escalou peixe e cuidou dele para que secasse e fosse enviado ao Libolo de origem onde era  trocado com macroeira.
 
Fubeiras e peixeiras, grandes lutadoras doutro tempo contra a fome e a mendicidade, criaram filos e ergueram casas sem nunca vender o "templo sagrado da mulher". E eram tempos de aperto e muitas bichas nas lojas do povo, onde só se comprava o que havia e não o que se pretendia. Os empurrões e kisendes não escolhiam nem poupavam idosos, grávidas e crianças, confundindo-se homens e pedras que representavam homens nas longas filas nos "supermercados" de então.
Peixe sardinha frito no pão e um chafé? Bem-vindo ao estômago que não escolhia!

Com fuba e peixe frito também se fez Revolução(?)!

Publicado pelo jornal Nova gazeta, 22/06/17

quinta-feira, junho 08, 2017

"NGELA" AOS MEUS OUVIDOS


A primeira vez que a guerra chegou aos meus ouvidos foi em 1983. Recuados da Kisala e cercanias chegavam com manadas de bois. Descansaram dias ou mesmo semanas na antiga Fazenda Israel onde havia tanques para abebeiramento e banho dos bovídeos. Porém a devastação das lavras dos aldeões locais, inexistência de pastos preparados para o efeito e a proximidade do asfalto os terá levado a procurar por outra área que já teve mesma serventia. A caminho do Kuteka, entre os rios Sangana e Bango, depois da9 Fazenda Costa Campos, estavam instalações pecuárias abandonadas por Manuel Pires. Lá se instalaram mas tiveram avultadas perdas. Cansaço do gado, falta de cuidados médicos, ausência de pastos, falta de sal entre outras maleitas. Em pouco tempo as mandas ficaram reduzidas a nada e os pastores tiveram de voltar às proximidade da Fazenda Israel, emprestando sua força à lavoura.

Depois começaram as implantações de minas na rodovia e ataques a viaturas.

O primeiro veículo a accionar uma mina foi em 1983, junto à Fazenda Kangulu. Foi numa tarde. O veículo procedente do Dondo fazia-se a caminho da Kibala. Nós residentes no Limbe pernoitamos na mata, a caminho do rio Lyaha. Os zum-zum sobre passagem da Unita e até mesmo reencontros fez-nos recuar pela primeira vez para o Fuke, aldeia contígua à estância hoteleira de Ngana Mbundu (Walter Kruk), onde ficamos uma semana. Regressados ao Limbe, os recuos se seguiriam mês após mês ou mesmo semana sim, semana não.

O segundo recúo deu-se no mesmo ano, 1983, depois do accionamento de nova mina no mesmo local da primeira, próximo da Fazenda Kangulu. Caminhando pelo sertão, chegamos a Kandemba, onde minha mãe tinha um tio, o velho Alfredo. Três dias foi nossa permanência naquela aldeia. De Kandemba a Munenga foi um passo. Mas as peripécias naquele ano e ano seguinte não mais parariam. Tempo depois, não muito tempo, um tractor carregado de cerveja, procedente do Alto Dondo, com destino ao Lususu acionaria uma mina, entre o rio Kazondo e a Bica d'Água. Perdemos o Santos Kajamba e o Zé Manel, que vim a conhecer mais tarde em Luanda, onde fomos vizinhos, perdia um dos pés. Primeiro recuo.

quinta-feira, junho 01, 2017

CÁRCERES E BAILES

Durante aqueles dias de cativeiro em que todos os acessos e saídas estavam controlados pelos kwaca (Unita), repletos de coisas roubadas em Kalulu e outras rapinadas pelas aldeias em que mantinham controlo, face ao processo de reagrupamento e reorganização que as FAA estavam a viver, a receita aos aldeões de Pedra Escrita era vezeira.
As mulheres deviam contribuir, todos os dias fuba e sacafolha/kizaka. Os homens com força de ir à caça ou à pesca deviam levar carne e ou peixe. Chamavam a isso de contribuição. Quando esses condutos faltassem eram as crias da aldeia que faziam o lugar. Os adolescentes iam à cata de lenha que alimentava uma grande fogueira junto a casa do soba.
A farra começava ao anoitecer. Homens de um lado: aldeões e militares olivados. As mulheres, também misturadas, posicionavam-se em outro lado do terreiro. No centro ficava o chefe que ditava os procedimentos e depois libertava o espaço para o baile.
Cabia às mulheres escolherem os parceiros para a dança. O inverso era reprimido. Os chefes dançavam até se fartarem, pois a eles se dirigiam quase todas as mulheres, de música em música.
Os jovens da kangonya eram reprimidos com severidade. Kandambalas sem dó. Mas havia uns atrevidos que confiavam na velocidade de suas pernas e na sagacidade de espiar o espião.
O agrupamento musical era deles. Chamavam-no "vozes negras". Eventualmente uma versão do outro que divertia os homens na Njambaba e Likwa. As violas eram eléctricas e batuques normais com microfone embutido. Usavam também um amplificador e colunas de som e canudos, do tempo antigo. A energia era gerada por um dínamo de bicicleta acoplado a um quadro com uma jante apenas. Os jovens e adolescentes da aldeia revezavam-se a rodar manualmente o pedal e accionar o mecanismo gerador de electricidade. Era aparentemente pacífico mas com represálias à espera, caso não colaborasse. A propagação do som, à noite, atingia um raio de cinco ou mais quilómetros. E o som da batucada não era apenas sinónimo de recreio. Era também aviso a outras aldeias do raio de que os kwacas estavam por perto e podiam ser visitados a qualquer instante.
Homens e mulheres vindos das matas, fardados ou não, cantavam eufóricos: Njmba, ponto de partida. Luanda, ponto de chegada.
 
As mulheres, servis, inebriadas pela propaganda mande in USA, entoavam ainda: "ocapitale onjamba, onjamba! Onacionale Likwa, Likwa!
Nunca aceitei ir apanhar lenhas e por isso fui catalogado por anti-motim ou com ideias empelistas. Aos bailes, ia apenas quando houvesse uma espécia de recolher casa a casa. Porém, na primeira oportunidade de fuga, quando a música se tornava ópio, retirava-me para casa e trancava a porta até ao dia seguinte, coleccionando na memória os detalhes daquele cárcere de cerca de um mês (1993).
Ainda sobre mim, os maninhos procuravam por um subterfúgio contundente para "me despacharem" ou, em sede de alguma clemência, ser "kandanbalado" (chicoteado simultaneamente por muitos). Gostavam, porém, do facto de ser o mais culto da aldeia, depois do meu primo Goncha, que era professor, amigo de copo e refilão. Esse acabou sendo raptado, meses depois para as matas, tendo reaparecido apenas depois da "Paz do Kamorteiro".
 
- O Dr. Savimbi gosta de pessoas estudadas como o maninho, só que tem de deixar esses hábitos de Luanda e essas ideias do Enduarto Sando. - Diziam para mim, em tom firme.
 
Volto com mais uma.